Vai, Arabella, me conta então a respeito dele! Li que ele é considerado o último viajante-naturalista do século XIX na Amazônia.
— Ganz genau, precisamente. Theodor Koch-Grünberg foi muito importante.
Antes de falarmos dele, precisamos lembrar que algo muito importante acontecia naquela região amazônica, no final do século XIX…
— …eu sei! Eu sei!
É o Ciclo da Borracha!
O látex para a indústria de borracha passou a ser um produto muito importante nas exportações brasileiras. Foi quando as cidades de Belém e Manaus começaram a crescer.
— Exatamente, Irani! O Ciclo da Borracha durou de 1879 a 1912. A seringueira é uma árvore amazônica. O látex começou a ser comprado para a indústria automobilística crescente nos Estados Unidos.
Como os seringueiros tinham que extrair o látex das árvores para produzirem borracha natural, entravam em conflito com os povos originários.
— Koch-Grünberg foi visitar a Amazônia bem nesse período. Era etnógrafo, conheceu muito a região. Fez quatro expedições.
— Imagina quanta coisa ele não viu…
— Viu, sim, muitas coisas. Ele entrou em contato com indígenas, entendeu seus costumes. Afirmou que os povos originários eram mansos e pacíficos. Inclusive, observou conflitos graves: as tentativas de levarem indígenas para trabalharem em seringais, a influência negativa da cachaça.
Explorou uma região quase desconhecida, trazendo, além de informações geográficas, dados interessantíssimos, como costumes, lendas, desenhos. Além de muitos livros, publicou 58 artigos em revistas, uma fonte de pesquisa para quem se interessa por antropologia, história da arte, linguística, psicologia e sociologia.
E sabia que o nome dele era apenas Theodor Koch?
Depois acrescentaria o nome da cidade em que nasceu no sobrenome. Por isso se chama Theodor Koch-Grünberg.
Também era chamado de Theo Koch.
Mapa da segunda expedição de Koch-Grünberg
As quatro expedições de Koch-Grünberg
1ª expedição | 1898-1900: Rio Xingu
Koch-Grünberg participa como fotógrafo e assistente de Herrmann Meyer. Não alcançam os resultados desejados.
2ª expedição | 1903-1905: Alto Rio Negro e Japurá
Viaja somente com Otto Schmidt e pessoas locais. Participa do cotidiano de tribos indígenas e a expedição é um grande sucesso. Publica Dois anos entre os indígenas: viagens ao noroeste do Brasil (1903-1905).
3ª expedição | 1911-1913: Rio Roraima até o Rio Orinoco, no sul da Venezuela
Resultados impressionantes: 1.000 fotografias, 85 gravações de áudio e algumas de filme, identifica 21 idiomas indígenas, relatos de lendas e costumes, coleção etnográfica e botânica. Publica Do Roraima ao Orinoco.
4ª expedição | 1924
O pesquisador americano e milionário Dr. Alexander Hamilton Rice convida Koch-Grünberg para integrar a expedição. Koch-Grünberg falece de malária.
Um tambor de sinais do povo Tukano no rio Tiquié. Foto de Koch-Grünberg durante a sua segunda expedição.
A foto mostra Theodor Koch-Grünberg com a obra de Karl von den Steinen. [Acervo de Theodor Koch-Grünberg da Coleção de Etnologia da Universidade de Marburg].
Theodor Koch nasceu na cidade de Grünberg, estado de Hessen, em 1872. Estudou filologia e trabalhou mais tarde como docente em várias universidades alemãs. Theodor morreu de malária em 8 de outubro de 1924, em Vista Alegre (Roraima), durante a sua 4ª expedição.
Na Biblioteca Digital Alemã, você encontra muitas obras de Grünberg digitalizadas, além de objetos e fotografias:
https://www.deutsche-digitale-bibliothek.de/person/gnd/11872410X
Durante sua 2ª viagem para os rios Negro e Japurá, entre 1903 e 1905, Theodor conheceu o fotógrafo alemão George Huebner (1862-1935), com quem manteve uma amizade por mais de vinte anos e que o ajudou em suas viagens ao Brasil. Graças a Huebner, temos várias fotografias de alta qualidade de Koch-Grünberg.
Carta de Huebner a Theodor Koch-Grünberg relatando o cotidiano da cidade de Manaus:
“Manaus, 16 de outubro de 1905
Meu caro amigo doutor Koch,
Recentemente, passei seis dias com o governador (Constantino Nery, governador do Estado do Amazonas de 1904 a 1906) no Rio Yauapéry. Infelizmente, mesmo tendo subido bastante o rio, não deparamos com nenhum índio. Provavelmente tiveram medo da embarcação a vapor. Somente há pouco tempo é que se passou a explorar a borracha no Yauapéry, e os seringueiros mantinham boas relações com os índios, com os quais faziam trocas. Isso quer dizer que as notícias que têm chegado, de que os índios teriam atacado os coletores de borracha, matando três homens e ferindo gravemente dois outros, pegaram-nos de surpresa. Em reação, o governador deslocou para o local dois oficiais e cinquenta soldados. Que vão fazer lá? É realmente um absurdo! Rio acima, devem existir diferentes tribos de índios, num total estimado de mais de 6.000 indivíduos. Por ora, os índios ainda são os senhores do rio, mas quanto tempo ainda lhes resta antes que sejam deslocados pelos coletores de borracha? A Companhia Antunes adquiriu a concessão daquele rio com vista à exploração da borracha e tinha iniciado, embora com dificuldade, o recrutamento de homens, que já estavam instalados no local. Assim que os índios apareceram, vários trabalhadores, com medo, retiraram-se; somente os mais corajosos continuaram no local. Após esses acontecimentos, todos bateram em retirada, e somente os soldados subiram o rio. Tão logo nos cheguem notícias mais precisas, não deixarei de comunicá-las a você. Envie-me quando puder alguns cadernos para a transcrição de línguas, pois – e isso é bastante provável -, se alguns desses índios forem trazidos prisioneiros aqui para Manaus, não deixarei de aproveitar a ocasião de transcrever algumas palavras.
Saiba que aqui você tem um amigo com quem pode contar no caso de necessitar, seja lá do que for e se desejar novamente fazer-nos uma visita em nossa província, dará a todos nós um imenso prazer. Espero que, apesar de suas obrigações com o cônsul alemão (Oscar Dusendschõn, negociante, principal exportador de borracha de Manaus), você tenha um tempinho para os outros amigos.”
REFERÊNCIA: SCHOEPF, Daniel: George Huebner 1862 – 1935: um fotógrafo em Manaus. Amazonas: Metalivros, 2000.
Assista ao programa “Viagens pela Amazônia” sobre os 100 anos do apogeu e decadência da borracha na região. A videorreportagem conta um pouco da história do Ciclo da Borracha, cercada por riqueza, glórias, miséria e trabalho análogo à escravidão:
Podemos considerar Koch-Grünberg como o último viajante-naturalista do século XIX na Amazônia. Etnógrafo e filólogo, Koch-Grünberg foi responsável por observações minuciosas, como a descrição dos Maku (Makú ou Makúli) durante sua 3ª viagem, entre 1911 e 1913:
“Etnograficamente, eles são os mais pobres dos pobres, mas as poucas coisas que têm são muito interessantes do ponto de vista científico: alguns cestos redondos, firmemente trançados, e apás grandes; pequenos apás redondos do mesmo trançado, que, em lugar do elástico tipiti das tribos mais desenvolvidas, aqui inexistente, servem para espremer a massa de mandioca ralada ao serem dobrados e esmagados com as mãos; pequenas cabeças esféricas com tinta vermelha para pintura corporal; novelos de fios de algodão, bem enrolados e embrulhados em folhas; flautas simples de taquara. […]”
KOCH-GRÜNBERG, Theodor. Do Roraima ao Orinoco. Tradução: Cristina Alberts-Franco. São Paulo: Editora Unesp, 2006. V. 1, p. 203.